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Patrimônio na metrópole: propostas para um roteiro judaico em São Paulo 1 - PARTE 3
Andréa Kogan 2
 
Propostas para um eventual roteiro judaico em São Paulo

1. Atrativos culturais e métodos de observação e análise
Os primeiro atrativos selecionados para esta proposta de roteiro turístico serão os gastronômicos. Entretanto antes de começarmos a descrição dos locais, é necessária uma breve explicação sobre algumas idéias referentes ao termo atrativo ou atrações turísticas. Miguel Bahl afirma que os atrativos culturais são oriundos das manifestações humanas e exigem certos cuidados no seu manuseio. Estes podem ser subdivididos em concretos e abstratos assim explanados:

• Atrativos culturais concretos: monumentos locais culturais, edificações, literatura, parques, praças e outros.
• Atrativos culturais abstratos: idiomas, dialetos, modo de vida (usos e costumes), religiosidade, música, atitudes e outros.

Alguns exemplos dados como atrações turísticas são os seguintes (dentro de um município/metrópole): monumentos (referentes à arquitetura religiosa, industrial, etc...), esculturas, pinturas e instituições culturais de estudo, pesquisa e lazer, manifestações e usos tradicionais e populares, festas e comemorações (religiosas, cívicas, etc...), gastronomia, artesanato.

Mário Jorge Pires salienta a necessidade da concentração de atrativos em uma mesma área, pois seu isolamento impede que possuam uma grande atratividade 64. O mesmo texto do autor revela que bens históricos que estejam isolados tornam-se empecilhos para a visitação pública. Podemos notar também, que a cidade de São Paulo possui muitos inibidores geográficos devido a sua grande extensão territorial.

A concentração dos atrativos em determinadas regiões é condição essencial para a elaboração de roteiros turísticos. Desta maneira, por meio dos conceitos vistos anteriormente, é possível desenvolver em uma sugestão para um roteiro judaico com seus respectivos atrativos na cidade de São Paulo.

No trabalho proposto, não será discutida a viabilidade de proposta em seus aspectos financeiros contábeis, assim como um maior detalhamento no que se refere à organização de um roteiro como infra-estrutura da cidade, acesso ou equipamentos turísticos, por não se tratar de um projeto turístico. O principal foco deste estudo é a simples consideração de atrativos potenciais configurando uma sugestão de roteiro turístico dentro da metrópole paulistana. Entretanto, vale ressaltar, como já citado anteriormente, a localização dos atrativos é de fácil acesso, pois os mesmos estão em bairros centrais da cidade, além da sua relativa proximidade entre eles.

Espalhados por certos bairros da capital paulistana, alguns restaurantes, lanchonetes e mercearias exercem papel fundamental na identificação da comunidade judaica com a cidade e a perpetuação de vários de seus valores. Tais locais podem vir a sugerir atrações gastronômicas para aqueles que não conhecem a cidade ou para os não-judeus residentes em São Paulo e também para os próprios moradores judeus da cidade que possam desconhecer os endereços citados, como foi enfatizado anteriormente.

Na metodologia utilizada para a coleta das informações descritas no trabalho foram utilizadas nossas potencialidades como observadora em conversas informais com alguns proprietários de alguns atrativos aqui mencionados, partindo também de alguns questionários básicos constituídos de algumas indagações.

As indagações relacionadas nos questionários foram as seguintes: perguntas pessoais relacionadas ao proprietário (como nacionalidade, idade, origem familiar); tempo de negócio e escolha da localização; horário de funcionamento e perfil do público.

Marcas fundamentais judaicas na paisagem paulistana são as sinagogas. Infelizmente tais templos não entrarão como parte dos atrativos judaicos por não estarem abertas para a visitação. Locais religiosos para a comunidade judaica podem ser alvos potenciais de atentados. Um triste episódio da história judaica mundial relativa ao preconceito, foi o atentado na AMIA (entidade judaica em Buenos Aires), ocorrido em 18 de julho de 1994. O prédio foi completamente demolido e dezenas de pessoas foram mortas. Em razão da relativa proximidade com São Paulo e o temor pela circulação no eixo entre as cidades levou a comunidade a adotar excepcionais medidas de segurança, além daquelas usuais para todos os habitantes de São Paulo. Pode-se observar tal fato na arquitetura externa das sinagogas mais recentes. Nenhuma delas ostenta marcas judaicas nas suas portas e nem denota qualquer característica religiosa. As sinagogas são cercadas por muros sem qualquer ornamento ou figura. Também cabe enfatizar a falta ou o pouquíssimo material escrito neste âmbito e assim, a impossibilidade de uma pesquisa mais profunda dentro dos limites a que nos propusemos.

Cabe, desta maneira, uma explicação referente somente a uma sinagoga que será abordada neste trabalho, devido à sua importância histórica e sua atual situação, a Knesset Israel, localizada no bairro do Bom Retiro e que foi totalmente desfigurada nas últimas décadas. Possibilidades de utilização do local serão descritas posteriormente. É necessário ressaltar a importância de um outro local de culto religioso, a Congregação Israelita Paulista (CIP), localizada à Rua Antônio Carlos, 653 no bairro da Consolação. O chefe do rabinato do local é o Rabino Henry 1. Sobel, e o prédio onde a sinagoga está localizada também é sede de vários departamentos como bolsa de empregos e salão para festas. Além das atividades religiosas, outros eventos são realizados no local, como palestras e festas para jovens. Uma das palestras do ano corrente (2001) foi a do ganhador do prêmio Nobel da Paz, Elie Wiesel (sobrevivente do Holocausto). De acordo com o rabinato do local, não há um estímulo para que as dependências da CIP sejam visitadas, mas as portas encontram¬se sempre abertas para as pessoas que desejam conhecer o local.

2. Restaurantes, lanchonetes e mercearias judaicas (não-casher)
CECÍLIA - Rua Corrêa de Melo, 174 - Bom Retiro.
A proprietária Cecília Judkowitch é a responsável pelo comando do restaurante e pelas receitas que figuram tanto no cardápio quanto na mesa do buffet. Em um ambiente bastante amplo, tanto judeus quanto não judeus podem saborear pratos judaicos além de saladas variadas. Além de possuir um serviço à la carte (escolha do prato pelo cardápio) há também o serviço self-service, onde cada pessoa serve-se no buffet de pratos frios, saladas, pratos quentes e sobremesas.

Pudemos constatar que a presença judaica não é predominante no restaurante e, cada vez mais, o número de freqüentadores não-judeus está aumentando. Atualmente pode-se estimar os freqüentadores em metade judeus e a outra metade não-judeus. Como na maioria dos restaurantes judaicos visitados, as receitas foram passadas de mãe para filha e fazem certos visitantes do local se emocionarem devido à proximidade com a sua terra de origem ou com a lembrança da mãe falecida que antigamente cozinhava, ou da avó que costumava fazer pratos típicos. É possível afirmar que várias das pessoas que chegam ao restaurante tentam resgatar o gosto de comida caseira judaica, esquecido pelos anos de vivência em um país distinto, daquele do qual se originam. A proprietária conta que certa ocasião um cliente a chamou em sua mesa chorando, pois o prato que ele estava comendo o fazia lembrar a comida da mãe que não mais vivia.

Além de pratos considerados típicos como o tcholent, varenikes (pequenos pastéis de batata) e sopas, há saladas diversas e vários tipos de pratos que podem ser considerados comuns em qualquer restaurante. Os ingredientes utilizados nas receitas do local são facilmente encontrados, de acordo com a própria Cecília. Batata, alho e cebola são alguns dos ingredientes básicos mais usuais na culinária judaica. Além do restaurante, a proprietária oferece cursos de culinária judaica em certas ocasiões do ano para interessados em geral. Os cursos são variados, mas não ocorrem com muita freqüência, um deles é sobre práticos típicos de Pessach. Alguns cursos podem durar um dia, quando a proprietária ensina o preparo de dois ou três pratos típicos judaicos.

Vale lembrar que a família da proprietária também ajuda na administração do local e é de ascendência ashkenazi. Entretanto, a equipe de garçons é composta de funcionários brasileiros não-judeus, que trabalham na casa já totalmente adaptados à língua diferente e aos pratos judaicos. Estes profissionais também explicam a composição dos pratos aos clientes.

As paredes do restaurante são enfeitadas com cartazes e quadros lembrando festas religiosas judaicas e fotos de pratos típicos.

SHOSHI DELI SHOP- Rua Corrêa de Melo, 206 - Bom Retiro
Os proprietários do restaurante são israelenses que chegaram há cerca de quatorze anos ao Brasil. A proprietária, Shoshana Baruch nos primeiros anos trabalhava no restaurante da mãe (Casa Búlgara) e depois abriu o seu próprio negócio com o marido. Especialidades judaicas e israelenses figuram no cardápio, como o peixe: gefilte fish e o pepino em conserva. Os pratos são escolhidos em um balcão e são cobrados de acordo com as porções, como em uma delicatessen. Ressalte-se aqui a semelhança das cozinhas oriundas do Mediterrâneo, assim, não é possível diferenciar muito claramente o que seria típico judaico ou árabe, por exemplo. Uma salada de pepinos com coalhada seca, por exemplo, é servida nas duas cozinhas e difícil de ser definida como judaica ou árabe assim, como diversos outros pratos.

O ambiente é decorado com quadros de motivos judaicos com fotos de Jerusalém e retratos sobre a cozinha sefaradi, devido à origem dos proprietários.

Quando entramos neste restaurante, percebemos que, pelo ambiente, estamos num prolongamento da casa de uma família judia, onde todos se conhecem e conversam animadamente. O casal de proprietários sempre está presente e circula pelas mesas trocando idéias com os freqüentadores. Além destas pessoas, a equipe de cozinha e de garçonetes é composta por não-judeus já adaptados a esse ambiente.

O movimento é sempre maior nos dias de semana, pois o local do restaurante é cercado por casas comerciais e recebe, diariamente, vários profissionais da região para o almoço.

BISTRÔ DA SARA - (antigo buraco da Sara) - Rua da Graça, 32. Bom Retiro.
Um dos primeiros restaurantes judaicos da cidade de São Paulo. Atualmente (no momento da realização deste trabalho) passa por uma reforma completa na sua estrutura física. Até a reforma o restaurante trabalhava no sistema self-service por quilo e misturava pratos típicos com pratos da culinária brasileira encontrados em qualquer outro restaurante.

A proprietária que dá o nome ao restaurante já é falecida e, até antes da reforma o filho administrava o local. Um dos primeiros restaurantes judaicos de São Paulo, ainda recebe vários visitantes que chegam de diversas partes da cidade pra degustar a comida judaica.

O antigo nome: “Buraco da Sarah" é explicado quando vemos o local, pois fica em uma esquina e para entrar é necessário descer alguns degraus que conduzem ao restaurante.

CASA BÚLGARA - Rua Silva Pinto, 356. Bom Retiro.
A Casa Búlgara é uma lanchonete famosa por um de seus salgados típicos: a bureka. Um salgado feito com massa folhada que pode levar diferentes tipos de recheio como batata (ingrediente mais comum), espinafre, queijo, dentre outros. A Casa Búlgara recentemente recebeu alguns prêmios de revistas especializadas, por possuir o melhor salgado da cidade: a bureka. A família ainda comanda o local que, além da lanchonete, fornece o salgado para diversas casas especializadas.

Não há espaço para muitas mesas, mas há um balcão com diversas revistas onde os clientes costumam saborear as burekas. Vários desses clientes não são judeus e são atraídos pelo famoso salgado. Os clientes chegam e várias localidades para experimentar o salgado no local ou levá-los para casa.

BURIKITA - Rua Três Rios, 138. Bom Retiro.
Além de comercializar a bureka, a lanchonete também conta com outros tipos de salgados e doces. O casal proprietário do restaurante veio da Europa e abriu uma lanchonete no bairro do Bom Retiro, sem pretensão de mudança para outro bairro. Há somente duas mesinhas, pois o grande movimento é de pedidos no balcão e encomendas gerais para eventos como festas e celebrações judaicas. Esse é mais um ponto comercial familiar, pois hoje é o filho do casal que toma conta da Burikita e dos negócios da família.

Durante a finalização deste trabalho o restaurante estava sendo reaberto com outra administração, e devido aos prazos para o depósito da dissertação não foi possível incluir novas características do local.

CASA MENORAH - Rua Guarani, 114 - Bom Retiro
Uma das principais mercearias do bairro do Bom Retiro com diversos artigos judaicos. Não há espaço para oferta de alimentação preparada no local como mesinhas ou algum tipo de balcão, mas a variedade de produtos é bastante expressiva. Além de comercializar vinhos e pães judaicos (como a chalá e o beigale), possui também alimentos casher distribuídos pela "Kosher delight" (que veremos posteriormente). A mercearia já é conhecida no bairro e conta com clientes fiéis e assíduos que estão acostumados com seus produtos há vários anos. Também é fato bastante comum que outros moradores de São Paulo visitem este espaço, como pude observar e constatar através de vivência no bairro, durante toda a infância e adolescência.

Z-DELI - Rua Haddock Lobo, 1386 - Cerqueira César.
Lanchonete que ultrapassou os limites do Bom Retiro e instalou-se em dois outros pontos da capital paulista. Há dois espaços em bairros distintos, o primeiro localiza-se no endereço acima mencionado e o segundo situa-se à Al. Gabriel Monteiro da Silva, 1350 - Jardim Europa. Em um espaço pequeno é possível comprar algumas iguarias da culinária judaica, como o gefilte-fish. A primeira loja foi inaugurada em 1982, nos Jardins, e o "Z" do nome equivale ao nome da proprietária - Zenaide, que foi quem teve a idéia original do restaurante, pois morou em Nova Iorque e a partir das inúmeras delicatessen lá existentes, resolveu trazer a idéia para o Brasil, seu país de origem.

3. Restaurantes, lanchonetes e mercearias (casher)
BERÔ - Rua Peixoto Gomide, 2020 - Jardim Paulista
O restaurante Berô foi inaugurado em fevereiro de 2000. É considerado um restaurante de padrão internacional e o mais requintado restaurante casher da cidade de São Paulo. Todos os alimentos usados no local são inspecionados por rabinos e profissionais especializados. Entretanto, a equipe que trabalha na cozinha não é formada por judeus. Mas todos dominam as regras de preparação e todas as normas de kashrut, inclusive vários nomes em hebraico de alimentos que a maioria dos judeus parece desconhecer. Há somente uma única pessoa, chamada de mashguia, que é responsável pela supervisão sobre observância das regras.

Além do cardápio com opções variadas como saladas, carnes, massas e sobremesas o restaurante prepara atrações quase todas as noites. Como exemplo disso, todas as terças-feiras há um churrasco que em tudo se assemelha ao das churrascarias comuns. Uma mesa de saladas fica no centro do local – onde se pode notar a influência da comida brasileira nas típicas bananas à milanesa –, garçons servem carne vermelha e frango, além de porções de arroz e batatas-fritas. As adaptações aos costumes locais são patentes. A carne, indubitavelmente obedece a kashrut, com sabor diferente das carnes comuns.

Os restaurantes casher não misturam carne com leite, como já foi dito, assim sendo, cada restaurante faz a sua opção, ou é um local exclusivo de carne ou exclusivo de derivados de leite. O Berô, como já descrito é um restaurante de carne. Os doces e pães são feitos com um tipo de creme de leite especial elaborado de soja ou até mesmo com suco de laranja (ingrediente de certos pães servidos).

O ambiente é agradável, mas não possui qualquer elemento decorativo que denote vínculos judaicos. Aberto todos os dias para almoço e jantar, fecha às sextas-¬feiras e abre as portas novamente no sábado à noite, logo após o término do Shabat.

Interessante notar que, além da equipe de cozinha, o maître e os garçons também não são judeus e servem no local, aparentemente adaptados ao ambiente. Por ser mais requintado e o preparo dos alimentos mais elaborado, o Berô não é sempre acessível, certamente devido ao preço. O local é também ponto de encontro para discussões e negócios, além de receber uma clientela variada de judeus e não¬judeus. No artigo do jornal “O Estado de São Paulo” de 02/02/2001 o colunista Marcelo Fromer comenta que é importante "... mostrar ao público que o Berô é para todos, transcende e atende não só e exclusivamente a esta restrita e exigente comunidade, mas sim a toda gente”.

KOSHER MEAL - Rua da Consolação, 3679 - Cerqueira César
Além de restaurante também conta com um mini-mercado onde são comercializados vários produtos casher como pães, bolachas, balas, etc... Oferece um cardápio variado e promove eventos com especialidades nacionais como churrasco, comida chinesa, japonesa e noite americana (com hambúrgueres e batatas fritas), para atrair a clientela que cada vez está mais exigente, pois locais de médio porte que oferecem comida casher parecem não primar tanto pela qualidade nos serviços e talvez não atendam o cliente da maneira correta, pois sabe-se que não há muitas opções no mercado.

KOSHER DELIGHT - Rua Baronesa de ltú, 436 - Santa Cecília
A pequena lanchonete localizada no bairro de Sta. Cecília possui pequenas mesinhas para a degustação de seus produtos, onde é possível ver a grande quantidade de mães judias religiosas com suas crianças passeando pelo bairro e ali parando para conversar, como em um ponto de encontro.

Na parte superior da lanchonete funciona um pequeno restaurante que parece, também, não prezar muito pelo bom atendimento ao cliente, como já citado no atrativo anterior. E mais uma vez se ressalta a importância da concorrência para fazer com que os restaurantes tenham um pouco mais de preocupação com a sua clientela, visto que em São Paulo são poucos os locais de alimentação casher para um público com um número bastante expressivo.

Além de lanchonete, a casa fornece também produtos casher para diversos estabelecimentos da cidade.

KOSHER CENTER - Rua Prates, 599 - Bom Retiro
O local possui três divisões. A primeira é um supermercado casher que comercializa diversos tipos de produtos. O segundo é uma lanchonete que processa salgados. E o terceiro é um restaurante por quilo, que além de pratos diversos possui uma curiosidade, o arroz e feijão, prova da assimilação ao meio, da absorção cultural. Por estar no Brasil, os pratos precisam adaptar-se aos gostos locais; e, nada mais local, do que o típico feijão e arroz.

CANTINA DO BERÔ - Rua Padre João Manoel, 881 - Cerqueira César
A cantina do Berô é especializada em pizzas e trouxe uma nova invenção aos seus freqüentadores que é a pizza de zátar (um tempero da região do Mediterrâneo muito usado na culinária árabe e sefaradi), além de diversos sabores. Como o nome denota são os mesmos proprietários do Berô que possuem este restaurante, embora não tão requintado como o primeiro.

Restaurante da escola IAVNE - BEITH CHINUCH - Rua Padre João Manoel, 727 - Cerqueira César
Dos mesmos proprietários dos restaurantes Berô e Cantina do Berô este restaurante fica dentro das dependências da escola. O restaurante serve por quilo e vende também pão e chalá, além de bolos diversos. Aos domingos, o restaurante é aberto ao público.

MATOK - Shopping Pátio Higienópolis, Av. Higienópolis, 646.
O Matok é o primeiro restaurante judaico em um shopping center da cidade de São Paulo. Localizado no Shopping Pátio Higienópolis, recebe judeus ortodoxos que desfrutam da sua culinária. Uma das razões claras da localidade do restaurante neste espaço é o alto número de judeus que respeitam a gastronomia casher que residem no bairro citado. Antes da implantação deste restaurante, podia-se observar que judeus religiosos não freqüentavam tanto o Shopping Center, pois não tinham opção de alimentação enquanto passeavam. Agora, isso é possível. Mudanças de hábitos são possíveis desde que os atrativos se voltem para as motivações dos consumidores potenciais.

Nota-se também que, como se trata de um restaurante "religioso", ele não segue os mesmos horários comerciais de Shopping Centers de São Paulo e suas respectivas praças de alimentação. O Matok fecha suas portas na sexta-feira ao anoitecer e reabre no sábado à noite, em respeito ao Shabat. E, certamente, por estar em um local que recebe várias pessoas dia e noite, a procura por esse tipo de alimento não é somente feita por judeus ortodoxos, mas por todos aqueles curiosos em experimentar novos sabores.

MATOK - Alameda Barros, 921. - Santa Cecília.
O Matok original (foi inaugurado anteriormente a sua filial do Shopping Pátio Higienópolis) é um dos restaurantes casher mais conhecidos da cidade. Podemos considerá-lo como ponto fundamental no bairro de Santa Cecília/Higienópolis e funciona, principalmente, como lanchonete e mercearia, além de também produzir encomendas especiais. Como curiosidade, a palavra matok em hebraico, significa "doce".

4. Reflexões sobre os elementos pesquisados
Finalizando esta etapa sobre os atrativos gastronômicos, é necessário ressaltar pontos já citados sobre a alimentação no judaísmo. O primeiro ponto já evidenciado nos locais propostos é a questão da memória alimentar. O que certos pratos transmitem não só para o paladar de cada indivíduo, mas também o fato de os pratos despertarem na memória, tempos imersos no passado e, sobretudo as lembranças afetivas. A alimentação é uma forma de lembrança de cada pessoa ou grupo e "cada prato, cada sabor é um elemento de memória. Memória do sagrado, memória do passado" 66 Enfatiza-se, também, sua importância gastronômica como parte integrante do patrimônio étnico e elemento de identidade cultural.

O ambiente de cada restaurante foi comparado, durante a descrição dos pontos de alimentação, com um ambiente familiar, uma atmosfera quase possível de ser reproduzida num local comercial, reforçando certos traços da família judaica. Observa-se ainda o papel fundamental da mulher nestes locais. A maioria dos restaurantes citados é comandada por mulheres e delas surgem os nomes dos mesmos como: SHOSHI DELISHOP - diminutivo de Shoshana, a proprietária; CECÍLIA - também como a proprietária e o antigo BURACO DA SARA - como a senhora proprietária que cozinhava no restaurante. Isto também é um elemento que reproduz a atmosfera familiar devido à posição e o papel da mulher como nutriz e mantenedora das tradições judaicas. "A mãe judia é responsável pela transmissão e a cozinha é o espaço social onde se recriam indefinidamente os fundamentos de uma ordem coletiva, é o lugar de reelaboração da história familiar" 67

Salienta-se também a importância da cozinha casher não somente como comida para judeus religiosos, mas como comida saudável, algo tão prezado nos dias de hoje. O casher (judaico) e o halal (muçulmano) não mais simbolizam somente uma prática religiosa, mas também a busca do indivíduo moderno pelo natural, por predileção pelos alimentos preservados e isentos de contaminação. Talvez estejamos tratando de uma provável tendência de consumo alimentar no mundo, pois atualmente um grande número de pessoas tem escrúpulos na escolha de alimentos, devido a epidemias que afetam animais, alterações genéticas ou até receio dos produtos industrializados. E, por estas razões, procuram alimentos casher, pelo cuidado na sua preparação.

Desta maneira, é possível vislumbrar todos os atrativos gastronômicos como pontos turísticos potenciais tanto no lazer do paulistano quanto para os turistas. Ainda que, a despeito do que se falou da qualidade dos alimentos, para satisfazer um público maior e atingir os objetivos da pesquisa realizada, os cuidados na confecção e os padrões para as vendas entre nós, precisem ser redirecionados. Como exemplo, é possível citar a ausência de um padrão para a chalá, vendida por um mesmo preço, embora os pães tenham quantidades e dimensões distintas entre eles.

5. A sinagoga KNESSET ISRAEL, o arquivo histórico judaico brasileiro e o TEATRO TAIB
A escolha destes atrativos potenciais deve-se à limitação das propostas ao Bom Retiro. Aqui pensamos, independente dos pontos gastronômicos citados em outra área, numa otimização e configuração com uma área muito rica e densa de atrativos como a Luz.

SINAGOGA KNESSET ISRAEL - Rua Newton Prado, 76
Conhecida como "a grande sinagoga" foi construída em 1916 e é sem dúvida um marco importante na história da comunidade judaica em São Paulo. Apesar de ter sido o mais importante templo judaico da cidade, atualmente passa por dificuldades financeiras e de manutenção, e não guarda nenhuma característica arquitetônica do passado, pois várias reformas foram feitas no seu prédio. Em uma dessas reformas, mais especificamente em 1966, o templo inteiro foi demolido e totalmente reconstruído. Desde 1966 até os últimos anos pequenas reformas foram realizadas. Em 1981, a atual sinagoga foi inaugurada, mas alguns anos mais tarde foram ¬colocados tapumes, para fechar a galeria superior; e divisórias, separando o andar térreo para homens e mulheres o que pode ser o resultado da diminuição dos freqüentadores.

O que podemos observar atualmente é que a sinagoga fica fechada a maior parte do tempo e só abre para as grandes festas. Além disso, as rezas diárias, necessárias segundo a Lei, são realizadas em um espaço anexo.

O salão de festas é um dos espaços que poderia ser melhor aproveitado pois tem capacidade para até 1.300 pessoas e quase não tem utilização. Inúmeros casamentos, bar-mitzvás e cerimônias foram realizados no salão deste templo que, provavelmente traduz com felicidade as memórias afetivas da comunidade. Há a necessidade, portanto, de um melhor aproveitamento. Um projeto para a melhor utilização dos seus salões poderia ajudar à requalificação do local e tomá-la mais presente para a comunidade. Com a ameaça de destruição pela venda do imóvel a comunidade perderia seu patrimônio e parte da memória desapareceria. Não há ainda nada concreto para a reutilização deste espaço, mas poderiam surgir propostas ¬articuladas ao processo de revitalização do Centro. Devido ao espaço privilegiado, poder-se-ia pensar em um pequeno museu de artigos judaicos ligados ao cotidiano e às práticas religiosas, uma exposição fotográfica e até mesmo uma extensão do Arquivo Histórico Judaico Brasileiro nas suas dependências. Devemos lembrar sua importância à comunidade e talvez a reconstrução do mesmo como atrativo.

Pouco tempo atrás a sinagoga Knesset Israel formou uma nova sede no bairro de Higienópolis, mais precisamente na Avenida Angélica, e todo o setor administrativo desde então funciona neste outro espaço. Além disso, a casa também funciona como sinagoga, onde foram feitas as devidas adaptações necessárias.

ARQUIVO HISTÓRICO JUDAICO BRASILEIRO - Rua Prates, 790
Em 1969, quando da formação do Centro de Estudos Judaicos da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, foi lançada a idéia de formar uma instituição para reunir documentos e material para pesquisa sobre a coletividade, que afinal só se concretizaria em 1976 68

Desde então a comunidade judaica de São Paulo conta com um arquivo especializado em preservar a sua memória. Instalado nas dependências do Colégio Renascença há poucos anos (já teve sua sede em várias outras entidades desde a sua inauguração, inclusive no clube A Hebraica) o AHJB possui diversos núcleos como uma biblioteca composta por mais de seis mil volumes, fototeca, arquivo de história oral, e hemeroteca, além de estudos na área de folclore, música judaica e genealogia. A equipe de profissionais é muito competente e oferece ajuda aos pesquisadores, sem qualquer custo.

Um boletim informativo é publicado há cerca de cinco anos com artigos referentes ao judaísmo e novas publicações.

O acervo está sempre aberto ao público e todos aqueles que desejam pesquisar ou conhecer materiais referentes à cultura judaica. Mais recentemente nota-se um envolvimento na realização de palestras e eventos, embora pouco divulgados. Além de servir como fonte de pesquisa para historiadores, jornalistas e estudantes, também poderia ser visto como atrativo. paulistano nesta sugestão para um roteiro.

Infelizmente o espaço que o AHJB ocupa não é suficiente para a realização de palestras ou eventos. Quando há qualquer tipo de comemoração ou evento é necessária a utilização de outro espaço. Seria interessante, portanto, a utilização, talvez do espaço próximo às dependências da sinagoga Knesset Israel, como já sugerido anteriormente.

TEATRO TAIB (Teatro Artístico Israelita Brasileiro), Rua Três Rios, 246
O TAIB faz parte da memória da comunidade judaica da cidade de São Paulo, assim como do teatro paulistano, formando atores e lançando peças de conteúdo relevante. Juntamente com o prédio anexo (número 252) que já foi conhecido como Casa do Povo, o local era palco de reuniões de judeus e não judeus politizados (de esquerda) nas décadas de cinqüenta e sessenta.

O teatro possui 472 lugares e várias peças infantis ainda são ali encenadas. Mas nada lembra o antigo teatro, pois a decadência é visível até na fachada da instituição. O local não é preservado e, logo na entrada, o cheiro de mofo é predominante.

Além das peças infantis, o teatro tenta sobreviver com o aluguel do espaço para eventos em geral, mas não há nenhuma divulgação dos mesmos e não é possível notar uma procura pelo espaço ali, visto que em São Paulo há muitas opções melhores, em situações muito menos precárias.

No espaço anexo, o prédio da antiga Casa do Povo é bastante amplo, contando com três andares e diversas salas. Ali já funcionou um cursinho universitário e ainda há grupo de coral de terceira idade.

Pelo local privilegiado, tão próximo dos diversos atrativos do Bom Retiro e da Luz, seria urgente uma intervenção para que o local voltasse a ter sua importância no contexto cultural na metrópole paulistana, evitando a perda de mais uma sala de espetáculos na cidade.

Isoladamente, nenhum dos elementos citados poderia ter uma significação maior. Integrados e coligados a outros atrativos não judaicos, além de evitar sua perda ou destruição como parte do patrimônio que é da comunidade tanto quanto é da cidade, poderíamos adensar a quantidade de atrativos no local (área da Luz expandida) dentro de uma perspectiva que ultrapasse monumentos pontuais, mas que pensasse em agenciar a área como local privilegiado para o lazer.

6. Bom Retiro e Luz – Sugestões
Nas divisões dos bairros da cidade de São Paulo é extremamente delicado o limite entre o Bom Retiro e o bairro da Luz. Por esta razão, vários dos atrativos da Luz poderiam ser sugeridos neste roteiro proposto em virtude da importância histórica dos mesmos na paisagem urbana. E, além disso, já são pontos turísticos potenciais da metrópole.

É possível citar vários atrativos no sítio da Luz. As Oficinas Culturais Oswald de Andrade, localizadas à Rua Três Rios, 363 utilizam-se das antigas instalações da Escola Politécnica de São Paulo, inaugurada em 1905. No ano de 1932, a chamada Faculdade de Farmácia e Odontologia ocupou o espaço e lá permaneceu até 1982, quando se mudou para a cidade universitária. O tombamento ocorreu em 1982 pelo CONDEPHAAT 69. Com o prédio totalmente restaurado em 1987, hoje as oficinas oferecem palestras, debates, cursos e workshops relacionados à fotografia, cinema, teatro, etc...

O Parque da Luz, ou Jardim da Luz ainda conta com uma bela paisagem em meio à metrópole. O jardim existe desde 1798 e foi criado como Jardim Botânico. O local ocupa uma área de mais de 113.000 metros quadrados e várias reformas entre 1868 e 1891 foram feitas. No ano 2000 uma intervenção no parque recuperou o coreto (de 1902) e colocou várias câmeras de segurança em todo o parque. Em 1981, foi tombado pelo CONDEPHAAT.

A Estação da Luz é conhecida também como um dos cartões postais da cidade de São Paulo. Em 1901 foi inaugurada com o nome de Estação da Luz, mas passou por um incêndio em 1946 e foi totalmente reconstruída e restaurada, abrindo suas portas novamente em 1950. Sua construção com um relógio alto na torre, nos remete ao famoso Big-Ben londrino. Além de funcionar vinte e quatro horas por dia, é um marco na história da cidade. O local também foi tombado pelo CONDEPHAAT, na década de oitenta.

O prédio da Estação Júlio Prestes ocupa papel fundamental nas sugestões deste roteiro. A sua construção foi feita entre 1926 e 1938 e era tida como estação inicial da estrada de ferro Sorocabana. A partir de 1990, a situação começou a mudar e parte do edifício tomou-se a Sala São Paulo - sede da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo. Depois de dezoito meses para a conclusão das obras a sala, com um hall de entrada com pé direito de vinte e quatro metros, foi inaugurada. E hoje é uma das salas de espetáculos mais importantes de São Paulo, possuindo capacidade para cerca de mil e quinhentos espectadores.

Próxima à Sala São Paulo está a Pinacoteca do Estado de São Paulo (Avenida Tiradentes, 141). A construção de 1905 foi projetada por Ramos de Azevedo e, antigamente, também funcionava como Liceu de Artes e Oficios. O local passou por restauração e reforma em 1998 e conta com acervo permanente de mais de cinco mil obras (apesar da maioria das obras estar emprestada ou em processo de restauro). O edifício também foi tombado.

Ainda na Avenida Tiradentes (número 676/688) estão o Museu de Arte Sacra e o Mosteiro da Imaculada Conceição da Luz. O museu está ali sediado desde 1970, mas as construções da igreja e do mosteiro datam do final do século XVIII e início do século XIX. Hoje, o mosteiro abriga as irmãs Concepcionistas que vivem em regime de claustro. O museu conta com obras de vários artistas, dentre eles Aleijadinho, em um acervo de quatro mil peças. Além disto, a capela do mosteiro é sede do culto a Frei Galvão (beatificado em 1998, pelo Papa João Paulo II na Basílica de São Pedro em Roma), despontando como centro de turismo religioso.

Nesta paisagem de São Paulo é possível observarmos a pluralidade religiosa existente e que transforma o local tão expressivo nesta metrópole globalizada que conhecemos hoje. Somente algumas quadras distante da sinagoga Knesset Israel e de várias sinagogas existentes no bairro do Bom Retiro, várias igrejas católicas também têm papel importante no meio urbano. Uma delas é a igreja de São Cristóvão, localizada na mesma Avenida Tiradentes (número 84), que foi construída em 1856 e tombada na década de oitenta, também tendo sido restaurada, além da Igreja Armênia, localizada ao final da avenida Tiradentes.

Esta riqueza cultural e turística dos bairros centrais citados corre o risco de ser perdida se sérias intervenções não forem feitas no local. Podemos notar, por meio deste breve resumo de atrativos, a existência de vários núcleos culturais dentro da metrópole. O acesso entre estes bens é extremamente simples, pois não é preciso carro, ônibus ou metrô, é possível fazer todo o trajeto a pé. E além de valorizar tantas atrações na mesma localidade, é necessário ressaltar que, para o lazer e o turismo, a conectividade entre elas e a concentração de recursos no mesmo sítio são fundamentais para o seu desenvolvimento.

Sintetizando nossas sugestões para o roteiro na Cidade, podemos considerar o eventual interesse de um público diversificado. Primeiramente, tal roteiro torna-se interessante para o lazer do paulistano que por vezes não saberia como dispor do seu tempo livre, tempo de não-trabalho (tanto para judeus e não-judeus) e com a sugestão de roteiro descrita, o paulistano poderia conhecer outras facetas talvez desconhecidas da sua Cidade. Em segundo plano, mas não menos importante tais propostas podem surgir como um roteiro para turistas, no qual encontraríamos tanto um público judaico interessado em conhecer os atrativos de uma região distinta daquela de onde é originário, ou para um público não-judaico. Como já enfatizado anteriormente, o público judaico teria curiosidade em conhecer outras comunidades diferentes daquela em que nasceu num país distinto ou em uma cidade diferente. Assim, o público não¬judaico passaria a contar com mais opções dentre as várias possíveis em São Paulo.

Outro acréscimo fundamental para as sugestões deste roteiro é o fato de o mesmo vir somar-se aos atrativos da região do centro da cidade de São Paulo, como também já foi apontado. Entretanto, é necessário que se articule com um Centro revitalizado para que este se torne, de fato, um pólo de atração numa das maiores metrópoles do mundo. Também é possível constatar neste roteiro a possibilidade de turismo ou lazer no local visto, pois seus atrativos são de fácil acesso, sem impedimentos geográficos, apresentando-se na proposta como elemento para maior adensamento de atrativos já consagrados.

Os atrativos podem facilmente se correlacionar com os atrativos não-judaicos mencionados, por sua localização e pelo interesse nesta região, a Luz, que é tão rica, tão pouco cuidada e talvez até esquecida.


Considerações Finais

A meta principal do trabalho aqui proposto foi cumprida. O Judaísmo não é só feito de tragédias e seu povo não pensa só em guerras étnicas. A cultura judaica precisa ser valorizada como ponto fundamental na miscelânea cultural desta metrópole, São Paulo, tão discutida neste trabalho.

Mais uma vez o Holocausto foi lembrado como algo que não deve sair da memória de nenhum cidadão, mas o povo judaico não deve ser lembrado só por isso. Há décadas atrás, quando não se ouvia falar em judaísmo em outros países da América do Sul, ninguém poderia imaginar a riqueza cultural existente em uma cidade de um país de terceiro mundo como São Paulo, no Brasil.

Os judeus trocaram os países em que viviam na Europa para abraçar um país novo, longínquo, mas com muitas promessas de trabalho e, principalmente de felicidade. Pelo menos era o que ouviam falar. Hoje, uma das principais metrópoles mundiais é sede de um patrimônio judaico expressivo e importante.

Alguns moradores da cidade pensam que a metrópole é composta de pessoas parecidas umas com as outras, que talvez respeitem uma só religião e tenham costumes similares. Esta sugestão de roteiro demonstra que, por mais que compartilhemos características, os traços similares pertencentes ao povo brasileiro, estão sempre presentes, mesmo que ocultos por trás de restaurantes típicos.

Para aqueles que crêem que somos todos totalmente diferentes, acreditamos em deuses diferentes e possuímos características opostas, este roteiro demonstra que somos distintos mesmo e ternos que aprender a apreciar o patrimônio alheio. Ambas as possibilidades são verdadeiras, e a partir do momento que a nossa nacionalidade é avaliada, esse sentimento traduz uma aparente ambigüidade. Pertencemos a um único grupo e a diversos grupos ao mesmo tempo. Isto também faz a riqueza do patrimônio cultural que não deve se fixar numa única vertente definidora de brasileiro, porque ele se articula em diversos eixos.

O turismo é organizado para atender todos os gostos. Às vezes achamos todos iguais e viajamos para locais que nos façam nos sentir em casa e acolhidos. Em outras ocasiões queremos o estranho, o olhar do turista que se deslumbra com tudo aquilo que vê, pois tudo é considerado diverso. E, em várias das vezes, que temos essas sensações ambivalentes estamos na nossa própria casa. Uma metrópole que abarca sentimentos diversos e pessoas distintas e por vezes similares é a melhor expressão desta bipolaridade.

O judaísmo também pode ser analisado sob este prisma. Tantas características similares com as outras religiões monoteístas, mas ao mesmo tempo tão distinta dessas mesmas religiões, com uma língua tão diferenciada do português.

A gastronomia judaica se confunde com a própria história da gastronomia. Nada pode se provar que seja completamente judaico, como foi já tratado neste trabalho, mas ao mesmo tempo, tudo pode ter uma raiz judaica, principalmente quando nos referimos a kashrut que se mantém e se altera nos seus aspectos relativos aos ingredientes.

As culturas são miscigenadas, nada é puro no mundo globalizado, na sociedade industrial pós-moderna. E é exatamente isso que o trabalho aqui proposto tenta resgatar, a mistura e as diferenças culturais que podem transformar-se em atrativos.

O mercado turístico está cada vez mais se segmentando e inúmeros segmentos surgem para quaisquer tipos de público. O turismo étnico vem propor ao turista que visita São Paulo, mais uma opção de lazer. Este nicho de mercado tenta resgatar o valor das culturas regionais neste mundo globalizado e mostrar as diferentes possibilidades de fazer turismo em uma metrópole.
 
1 Por razões editoriais esse trabalho foi dividido, e será apresentado em duas partes.

2 Andréa Kogan é mestre em Turismo; graduada em Letras, língua e literatura inglesa pela PUC-SP. Atual diretora de Turismo e Hospitalidade da UNICID, Universidade Cidade de São Paulo, e professora dos cursos de graduação e pós-graduação, em cursos de Letras dessa Universidade. Foi também docente nos cursos de Turismo e Hotelaria do SENAC-SP.

3 A diáspora (ou dispersão) judaica é um conceito que se refere aos judeus que imigraram da antiga Palestina, principalmente para a região constituída pelo antigo Império Romano; fora do Estado de Israel (dispersão acentuada pela destruição do Segundo Templo em Jerusalém).

4 SORJ, Bernardo. “Sociedade Brasileira e Identidade Judaica”. In: SORJ, Bila (org.) Identidades Judaicas no Brasil Contemporâneo. Rio de Janeiro: Imago, 1997.p.28

5 Vale lembrar que há alguns estudos que mostram a chegada de judeus junto com as caravelas de Cabral, mas em virtude de uma necessidade de delimitação do trabalho proposto, o mesmo analisa a chegada dos judeus a partir do final do século XIX.

6 De acordo com George Simmel, em Metrópole e a vida mental, a metrópole sempre foi a sede da economia monetária, além de implicar que o homem que lá vive tenha uma consciência mais elevada e uma predominância da inteligência.

7 HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Trad. Tomaz T. Silva e Guacira L. Louro. 3.ed. Rio de Janeiro: DP&A, 1999.p.62

Várias formas de turismo são conhecidas através da segmentação do mercado pelas ferramentas de marketing. As ferramentas procuram segmentar o público pela sua idade, hobbies, posição social, religião, etc... O marketing não é o alvo principal deste trabalho.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da república Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.

PIRES, Mário Jorge. “Levantamentos de atrativos históricos em turismo – uma proposta metodológica”. In: LAGE, Beatriz H.G., MILONE, Paulo C. (org.) Turismo: teoria e prática. São Paulo: Atlas, 2000. p.111.

A pós- modernidade, não é facilmente traduzida ou explicada, nem existe a seu respeito qualquer consenso acadêmico, mas de acordo com Luiz G.G. Trigo, em A sociedade pós- industrial e o profissional em turismo, podemos notar que a época é de novas tecnologias, educação em um mundo que se transforma rapidamente, lazer, cultura e turismo ocupando posições centrais, questionamento dos metadiscursos dos organizadores de pensamentos, era do conhecimento, etc...

MORAES, Claudia C. “Turismo – segmentação de mercado: um estudo introdutório”. In: ANSARAH,Marilia Turismo segmentação de mercado. São Paulo: Futura, 1999. p.19.

KRIPPENDORF,Jost. Sociologia do turismo para uma nova compreensão do lazer e das viagens. São Paulo: Aleph, 2000. p. 54.

COOK,Roy,YALE Laura, MARQUA, Joseph. Tourism – the business of travel.New Jersey: Prentice Hall,1999 p. 32. “O antigo ditado, você não pode agradar a todos, o tempo todo, certamente é verdadeiro no que diz respeito às empresas turísticas. Se você não pode agradar o todos, a quem você deve agradar? Uma resposta comum a essa pergunta é focar os esforços de marketing à segmentação dos consumidores potencias em necessidades e desejos razoavelmente similares”. Tradução da autora.


RYAN, Chris ‘The time of Our Lives`or Time for Our Lives: An Examination of Time in Holidaying. In: RYAN, Chris (org) The Tourist Experience: A New Introduction. New York. Cassel, 1997 p. 201 “As férias são os melhores tempos da vida e elas possuem a oportunidade de criar um tempo memorável”. Tradução da autora.

17 LAGE,Beatriz. “Segmentação do mercado turístico”. In: Turismo em Analise, v3, n.3, nov/92.

18 MIELENHAUSEN, Ulrich. “Gestão do mix promocional para agências de viagens e turismo”. In: LAGE, Beatriz e MILONE, Paulo. Turismo: Teoria e Prática. São Paulo: Atlas 2000. p.52

19 Op.Cit.

20 Jairo Fridlin é escritor, tradutor e grande conhecedor da cultura judaica (algumas obras tradução e transliteração da Hagadá de Pessach, Machzor completo,Sidur completo e Salmos) A Sêfer está localizada à Alameda Barros,893.Home page: www.sefer.com.br, e-mail sefer@sefer.com.br.

22 Extraído do original em inglês do texto “Ethnic identity and tourism marketing” in WITT, Stephen and MUTINHO, Luiz. Tourism marketing and management handbook UK: 1989, Prentice Hall. p. 137.

23 SCLIAR,Moacyr. “Em busca da identidade judaica”. In revista Kol News, Suplemento especial. Abril 2001. p.28

24 WARNIER, Jean-Pierre. A mundialização da cultura. Trad. Viviane Ribeiro. São Paulo: Edusc,2000. p.72.

25 HALL, Stuart. A identidade cultural na pós –modernidade. 3.ed. Rio de Janeiro: DP &A p. 77.

26 ASHERI, Michael . O judaísmo vivo - as tradições e as leis dos judeus praticantes 2. ed. Rio de Janeiro: Imago, 1995 p. 255.

28 SIMMEL,Georg. “A metrópole e a vida mental”. In: Textos básicos de ciências sociais. Rio de Janeiro: Zahar,1967. p 23.

29 DUMAZEDIER, Joffre. Lazer e cultura popular. 3. ed. São Paulo: Perspectiva, 2000. p 25

30 PLES,Cristina Férias? Nem pensar. Revista Veja, edição 1693 ano 34 número 12 – 28 de março de 2001. Apesar de referencia da mídia, denota os problemas vigentes na sociedade metropolitana.


32 DUMAZEDIER, Joffre. Lazer e cultura popular .3. ed. São Paulo: Perspectiva, 2000. p 34

33 KRIPPENDORF,Jost. Sociologia do turismo para uma nova compreensão do lazer e das viagens.
São Paulo. Aleph:2000. p.36.

35 UNIBES – União Israelita Brasileira do Bem Estar Social “criada em 1976 que foi o resultado de um processo sistemático de pelo menos cinco anos de reuniões entre as diretorias de Ezra, Linath Hatzaked, três entidades com uma longa tradição e trajetória de trabalho assistencial, associado aos imigrantes e a própria formação da comunidade judaica paulista entre os anos de 1910 e 1920”. In CYTRYNOWICZ, Roney (coord). Unibes - 1915-2000. Uma história do trabalho social da comunidade judaica em São Paulo. São Paulo: Narrativa-um, Projetos e pesquisas de história, 2000.

36 Organizações políticas sionistas que fazem reuniões semanais onde os membros formam grupos de dança, fazem e ouvem palestras e discutem sobre judaísmo.

37 No clube A Hebraica este grupo existe há diversos anos e os membros fazem atividades diversas como palestras e pré-estréias de peças que entrarão no circuito teatral da cidade. Como o próprio nome já diz, é direcionado a pessoas solteiras (há também uma limitação de idade mínima e talvez máxima para participar dos eventos).

38 Podemos notar dois guias semanais, um deles publicado as sextas-feiras pelo jornal A Folha de São Paulo, totalmente dedicado a opcoes de entretenimento do paulistano ( como shows, pecas de teatro,bares,restaurantes,cinema,exposição, etc...) E também a revista Veja São Paulo, revista semanal que mostra as opções da semana referentes a cinema ,teatro,shows,concertos, etc...

39 GRUN, Roberto. “Construindo um lugar ao sol os judeus no Brasil” In: FAUSTO, Boris (org).Fazer a América A imigração em massa para a América latina. São Paulo: Edusp, 1999 p. 354.

40 GRUN, Roberto. Construindo um lugar ao sol os judeus no Brasil In FAUSTO, Boris (org).Fazer a America A imigracao em massa para a America latina São Paulo. Edusp, 1999 p. 354

41 JEFFREY, Lesser. O Brasil e a questão judaica. Trad. Marisa Sanematsu. Rio de Janeiro: Imago, 1995. p. 316.

42 CARNEIRO, Maria Luiza T.O anti-semitismo na era Vargas (1930-1945). São Paulo: Brasiliense, 1988 p 52.

43 BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e Holocausto . Trad. Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998. p 11.

44 O pesquisador e sociólogo LAZO, Albino Ruiz, divulga em artigo do jornal o Estado de São Paulo. “Há escravos em São Paulo. Estão em prisões infectas nos subterrâneos do trabalho ilegal, circulam pelas ruas antes do nascer do sol e, sobrevivem vizinhos de todos nos, na esquina do inferno com o mundo globalizado” de 18/03/2001 escreve: “Os coreanos foram os primeiros a chegar em São Paulo a partir de 1963, quando a falta de trabalho reinava na Coréia do Sul. Em 1982, foi lhes dada a anistia e centenas de lojas atacadistas havia florescido no Brás e Bom Retiro . Já os Bolivianos habituados a ir de um lugar para o outro a viver em túneis e ver o mundo e a luz do dia umas poucas horas por semana acomodaram-se em viver nas oficinas de costura dos coreanos em condições semelhantes ou piores que as enfrentadas nas minas.

46 FAUSTO, Boris. “Imigração: cortes e continuidades” In: História da Vida Privada no Brasil. V.I. São Paulo Companhia de Letras, 1998 p 34.

48 ASHERI,Michael. O judaismo vivo Trad. Jose Octavio de Aguiar Abreu. Rio de Janeiro: Imago 1995. p 159.

50 ASHERI Michael O judaísmo vivo. São Paulo: Imago 1995 p. 118.

51 HECK, Marina BELUZZO, Rosa Cozinha dos imigrantes – memórias e receitas. São Paulo: Companhia Melhoramentos, 1998. p 325

52 SOLER, Jean. “As razões da Bíblia: regras alimentares hebraicas”. IN: In Flandrin, Jean Luis e Montanari, Massimo História da Alimentação. São Paulo: Estação Liberdade: 1996 p. 109.

53 ASHERI Michael O judaísmo vivo São Paulo: Imago, 1995 p. 125.

55 DOLANDER, Miguel Angle. “A alimentação judia na Idade Média”. In Flandrin, Jean Luis e Montanari, Massimo História da Alimentação. São Paulo: Estação Liberdade, 1996 p 363.

56 ASHERI Michael O judaísmo vivo São Paulo: Imago, 1995 p. 125.

57 MONTANARI, Massimo. “Sistemas alimentares e modelos de civilização”. In Flandrin, Jean Luis e Montanari, Massimo: História da Alimentação. São Paulo: Estação Liberdade 1996 p 109.

59 Depoimento registrado na obra de HECK, Marina e BELUZZO,Rosa Cozinha dos Imigrantes Memórias e receitas São Paulo: Companhia melhoramentos, 1988 p 227.

60 Op. Cit p. 14.

62 CURY, Isabelle (org.) Cartas patrimoniais. 2.ed. Rio de Janeiro: IPHAN, 2000. p.363/364

63 CULTURA HOJE. Informativo do Ministério da Cultura. Ano 5. 15 de agosto de 2000.

64 BAHL,Miguel Legados étnicos na cidade de Curitiba: opção para a diversificação da oferta turística local. Dissertação de mestrado p 26

65 O restaurante no shopping já foi fechado.

66 SIMON-NAHUM, Perrine. “Ser judeu na França”. In: ÁRIES, Philippe; DUBY, Georges. História da Vida privada. Vol.5. São Paulo: cia. Das Letras, 1992. p.467.

67 Op. cit. P. 465.

68 Boletim Informativo. Arquivo Histórico Judaico Brasileiro. Ano V. número 22. Maio 2001

69 Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo.