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Turismo e Museus
 
Autor: Camilo de Mello Vasconcellos
Editora: Aleph
Coleção: ABC do Turismo
Sinopse: Hoje é quase impossível conhecer algum turista que, viajando pela França, Inglaterra, Espanha, México ou Estados Unidos, não tenha visitado os principais museus desses países. Tais instituições vêm sendo procuradas por uma legião cada vez maior de visitantes, ávidos por conhecer as distintas manifestações culturais e artísticas de povos com os quais não mantêm contato, ou cujos acervos sugerem alguma “viagem” pelo imaginário.

No Brasil, a visitação a museus também vem crescendo, estimulada pela procura por roteiros e programas que fujam do tradicional trinômio “praia, sol e floresta”.

Abordando de forma competente e criativa um tema pouquíssimo explorado, este livro traça um panorama das possíveis relações entre museus e turismo. Revela que, antes visto como local meramente contemplativo, o museu é hoje compreendido como espaço interativo, um instrumento de conhecimento e de reconhecimento de particularidades e de diferenças. Demonstra, enfim, porque o turismo está redescobrindo esse lugar de grandes novidades.FONTE:Editora Aleph

Resenha Crítica: por Débora Dutra
A relação entre turismo e museus pode parecer bastante natural, em um primeiro momento. Mas esses dois universos, embora afins, mantiveram-se por longo tempo apartados, especialmente no Brasil; e só muito recentemente vêm-se vislumbrando alternativas reais e efetivas de uma parceria que traga benefícios comuns. É justamente sobre essa nova e concreta possibilidade de uma relação duradoura e proveitosa que trata o livro Turismo e Museus (Aleph, 2006).

Camilo Vasconcellos – historiador, professor e vice-chefe da Divisão de Difusão Cultural do MAE-USP (Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo.) – estabelece, então, um diálogo simples e direto com o leitor ao buscar entender e refletir com ele sobre o tema, traçando assim um panorama das possíveis relações entre turismo e museus.

No Brasil, a cultura e o turismo foram equivocadamente considerados dois mundos distintos. [...] De modo geral, o mundo da preservação patrimonial – onde estão inseridos os museus – foi sempre percebido como uma função do Estado, e o turismo como objeto exclusivo da iniciativa privada. Até pouco tempo atrás, os museus acolhiam o público escolar com grande simpatia, e com freqüência apenas toleravam a presença de grupos de turistas em seus espaços. (p. 47)

Essa constatação já dimensiona o mal-entendido e a falta de comunicação entre esses dois universos. Em sua bem-sucedida proposta de reconstituir as afinidades e rearticular as ações e os interesses desses atores, o autor estrutura seu livro em três capítulos: no primeiro, trata da evolução da instituição museu numa perspectiva histórica; no segundo, discute mais diretamente a relação entre o fenômeno turístico e o mundo dos museus, considerando sempre, por um lado, a relevância do turismo como agente mobilizador da economia e da cultura, e por outro, o importante papel que os museus podem e devem desempenhar nessa frutífera e desejável associação; no terceiro capítulo, analisa a realidade museológica brasileira e discute as potencialidades e as perspectivas de uma aproximação com o trade turístico.

Essa caminhada começa, então, na origem dos museus, desde suas primeiras manifestações, passando pela formação das coleções, pelo entesouramento de bens por parte de indivíduos e de instituições até os gabinetes de curiosidades e de obras de arte, dos quais nasceriam os museus de história natural, de arqueologia e de belas-artes.

O século XVIII é emblemático. Após a Revolução Francesa (1789), as grandes coleções tornam-se públicas e passíveis de serem visitadas em diferentes museus, que adquirem renovada importância. Com a ascensão da burguesia uma nova concepção foi incorporada a esse universo: a noção de patrimônio. Também foi um período em que os museus passaram a exercer um papel relevante na questão do ensino.

Sob essa perspectiva foram criados vários outros museus europeus no século XIX e início do XX; mas a essa altura do texto o autor faz uma ressalva importante: mesmo que esses museus tenham sido concebidos como instituições públicas, diferem, em termos de concepção, daqueles que consideramos hoje instituições a serviço do público, especialmente os espaços criados na segunda metade do século XX não só na Europa, mas também na América Latina e nos Estados Unidos. (p. 20)

E aí chegamos ao nosso continente, onde a influência européia ainda predominava no século XIX. Os museus nacionais dos principais países latino-americanos foram criados nessa época, no contexto do surgimento e independência dos Estados Nacionais, inclusive o brasileiro; oportunidade em que o livro nos apresenta os mais antigos museus do nosso país.

No entanto, a maioria dos museus brasileiros foi criada no século XX, principalmente a partir das décadas de 1930 e 1940, sempre por meio de iniciativas oficiais e inclinados, sobretudo, a afiançar o nacionalismo e exaltar os grandes heróis ou as riquezas naturais do Brasil.

O século XX também representou um período de reflexão, questionamento e de inovações para o mundo museológico, cujo maior desafio foi tornar suas coleções e suas propostas cada vez mais acessíveis a todos os visitantes. Na década de 1960, particularmente, os museus iniciaram movimentos que visavam uma atuação mais incisiva junto a escolas, comunidades de entorno e segmentos sociais mais populares; assumiram, então, novos formatos que derivaram em propostas mais participativas como, por exemplo, os ecomuseus, na década de 1970.

Após expor ao leitor a trajetória histórica dos museus, o livro avança para a discussão de sua relação com o turismo, apontando possibilidades e limites, prós e contras dessa interação. Revela, porém, muito mais afinidades do que divergências entre esses dois universos, descortinando reais alternativas de associação. Apresenta diversos aspectos contemplados pelos museus e que podem ser complementados e/ou incrementados pelo turismo cultural, como a divulgação de seu papel de veículo de conhecimento e de reconhecimento de particularidades e diferenças das diversas culturas; e o redimensionamento de seu papel social e educativo ao cooperar para a democratização de seus espaços, prestando, assim, uma efetiva contribuição no sentido de tornar o museu mais que uma instituição aberta ao público, mas um espaço a serviço deste.

Vasconcellos lembra, também, que o sucesso dos museus mais importantes do mundo se deve não apenas à qualidade de seus acervos, mas a uma estrutura consolidada do ponto de vista de suas instalações, a espaços agregados como bibliotecas acessíveis, livrarias, lojas e restaurantes – “que contribuem enormemente para que essas instituições sejam referências culturais e de lazer para os turistas” – e a estratégias de marketing bem dinâmicas, além de recursos humanos especializados no atendimento aos diversos tipos de público e uma relação privilegiada com seu entorno.

O autor demonstra que os museus brasileiros, ainda que timidamente, estão voltando sua atenção para os turistas, e que estes, cada vez mais, se interessam por roteiros e programas que fujam do tradicional trinômio “praia, sol e floresta”; defende, assim, a maior participação do museu com suas comunidades e com os agentes do turismo, engajando-se no planejamento e definição de circuitos integrados ao turismo cultural; e deixa claro que essa parceria, muito mais que desejável, é bem-vinda e inevitável, mencionando aspectos concretos e factíveis para sua viabilização. Apresenta, por fim, algumas instituições brasileiras que vêm realizando um sério trabalho no âmbito museológico e que poderão perfeitamente estar abertas à visitação do turista, nacional e internacional.

Turismo e Museus, ainda que conciso, traz uma significativa contribuição para pesquisadores e profissionais envolvidos com essas duas áreas de atuação, não apenas por colocar em debate uma associação tão cheia de possibilidades, mas por se disponibilizar como fonte qualificada e acessível de consulta diante de uma bibliografia bastante escassa, mesmo em nível internacional.

Se a relação entre instituições museológicas e turismo ainda se encontra em uma fase de conhecimento mútuo e de ações incipientes, este livro, por si só, já constitui um passo à frente na concretização dessa parceria.